"Entre o conservador e o tradicionalista, a distância é invencível.
O conservador aceita o facto consumado, não apenas como facto, o que seria científico, mas como bem indiscutível. Pode o seu sentimento revoltar-se contra o significado humano do facto, mas, logo que este se conclui e estabiliza, o conservador sente-se incapaz de se lhe opor.
Por isso a sua atitude perante os factos novos é caracterizada, na melhor das hipóteses, por uma miúda e mesquinha luta de posições, porque lhe importa sobremaneira impedir a ocupação pelo adversário do mais pequeno recanto da vida social.
Ao contrário, o tradicionalista é capaz de valorizar até os factos isoladamente contrários aos princípios fundamentais da doutrina que professa. Senhor de uma visão rasgada e profunda da História, recusa-se a disputar palmo a palmo o terreno pretendido pelo inimigo real ou aparente. Sabe que a história humana não é semelhante a um desdobrar tranquilo e lógico dos teoremas e dos corolários, mas inclui e arrasta muitos elementos aparentemente inúteis ou prejudiciais, e, no entanto, susceptíveis de receber do bem e da verdade um sentido e uma salvação.
Nesta perspectiva, o tradicionalista não apenas aceita cientificamente os factos de observação imediata, como lhes dá um significado superior, pois procura extrair deles um bem que eles não permitiam."
Henrique Barrilaro Ruas, in "A liberdade e o Rei", Lisboa, 1971
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